Incentivo à Mobilidade Urbana Sustentável

O transporte é responsável pela maior parte das emissões de gases de efeito estufa dentro do espaço das cidades brasileiras. O uso massivo de automóveis de combustão, além de contribuir para emissão de gases e poluentes prejudiciais à saúde humana e ao meio ambiente, acaba por congestionar as vias de circulação as quais, inclusive, tendem a se estruturar de forma a priorizar tais veículos, em detrimento de outros modais. Nesse contexto, a mobilidade em espaços urbanos é uma das metas mais importantes para governos municipais, uma vez que esta tem relação direta, não apenas com a qualidade de vida de seus habitantes, como também com a geração de impactos positivos sobre o meio ambiente e promoção de crescimento econômico mais sólido e sustentável.  

São diversas as estratégias que podem ser aplicadas de forma a se atingir a sustentabilidade do ponto de vista da mobilidade urbana. As principais são o subsídio ao transporte público de qualidade (zero emissões), o incentivo à mobilidade não motorizada (favorecendo o deslocamento a pé ou por meio de bicicleta com infraestrutura adequada) e o desestímulo do uso de automóveis através da supressão de vagas e cobrança para estacionamento em vias e edifícios públicos, por exemplo.  

Implementação de políticas públicas de mobilidade na esfera dos edifícios públicos 

Enquanto o planejamento da mobilidade urbana requer muita técnica e ações de longo termo, a administração pública pode tornar os seus próprios edifícios e locais de trabalho mais condizentes com os objetivos de mobilidade da cidade ao executar estratégias como as abordadas a seguir: 

  • Criar um plano de gestão de mobilidade corporativa e incentivar edifícios comerciais a fazerem o mesmo. O plano de gestão de mobilidade começa com o levantamento dos dados sobre o deslocamento atual dos trabalhadores, e as condições e alternativas de transporte disponíveis dentro e fora do edifício (Figura 38);  

Figura 38. Estratégias de gestão de demanda de viagens (GDV) em organizações Fonte: WRI, EMBARQ, 2015.

  • Metas por tipo de deslocamento de trabalhadores (por exemplo, 50% das viagens serão feitas por ônibus BRT em 10 anos, 20% dos deslocamentos serão feitos a pé ou por bicicleta, etc..) com base nos dados recolhidos; 
  • Criar alternativas e infraestrutura para atingir as metas (Figura 39): exigindo lugares seguros para estacionar bicicletas no curto e médio prazo em todos os edifícios públicos, fornecendo vestuários e providenciando alternativas de carona. Reorganizando o estacionamento, ou fazendo uma licitação ou rodízio para diminuir o uso de carros. Estimular os empregados a caminhar, pedalar, usar transporte coletivo, organizar caronas e gerir o uso do automóvel, não apenas contribui para a cidade e para o meio ambiente, mas também proporciona benefícios para a própria instituição. 

Figura 39. Alguns métodos de afastar e atrair as escolhas individuais para maior mobilidade Fonte: Banco Interamericano de Desenvolvimento 2013.

  • É cada vez mais evidente a necessidade de se colocar exigências com relação a mobilidade sustentável nos códigos de obras, o que inclui a demanda por áreas de recarga para carros elétricos, considerando que até 2040, 33% de todos os carros do mundo serão elétricos, de acordo com Bloomberg (2018).  
  • Desenvolver metas para veículos de zero emissões de carbono nos contratos do município e para os veículos particulares que circulam dentro da cidade – principalmente para os ônibus, que serão inicialmente em maior número do que os carros elétricos. Muitas cidades da Europa e dos Estados Unidos estão criando metas de eletrificação de seus ônibus dentro da próxima década. Até 2040, espera-se que 80% da frota de ônibus global seja de ônibus elétricos, de acordo com Bloomberg (2018).

Política Nacional de Mobilidade Urbana 

A Política Nacional de Mobilidade Urbana, alinhada aos preceitos do Estatuto da Cidade (Lei 10.257/2001), a qual coloca o planejamento urbano como instrumento essencial para o desenvolvimento sustentável das cidades brasileiras, determina aos municípios a responsabilidade em planejar e executar a política de mobilidade urbana. Em 2012, foi decretada a Lei Federal 12.587/2012 (Lei de Mobilidade Urbana) que institui as diretrizes da Política Nacional de Mobilidade Urbana e institui aos municípios a elaboração e execução do planejamento da mobilidade urbana.  

A Lei de Mobilidade Urbana coloca diversas atribuições para os Municípios (Artigo 18), que envolvem o planejamento, execução e avaliação da política de mobilidade urbana, regulamentação dos serviços de transporte urbano, prestação de serviço de transporte coletivo público e capacitação e desenvolvimento das instituições vinculadas à política de mobilidade urbana municipal. Além disso, os Municípios com mais de 20.000 habitantes ou aqueles que se inserem nos parâmetros expostos no Artigo 41 do Estatuto da Cidade, são obrigados a elaborar um Plano de Mobilidade Urbana, compatível com os respectivos planos diretores e que deve passar por revisão e atualização periódica, em prazo não superior a 10 anos.  

Na Lei, coloca-se como diretriz o desenvolvimento sustentável das cidades, com mitigação dos custos ambientais e socioeconômicos dos deslocamentos de pessoas e cargas nas cidades. No Artigo 23 são listados instrumentos de gestão do sistema de transporte e da mobilidade urbana, muitos dos quais, se alinham aos preceitos de sustentabilidade. Existem também, diversos documentos, como guias e manuais elaborados por instituições de referência que tratam da questão da mobilidade sustentável, envolvendo a implantação de sistemas de transporte com fontes energéticas limpas, incentivo ao deslocamento a pé e desestímulo ao uso de automóveis.  

É importante ressaltar que a integração da gestão metropolitana é fundamental para a existência da mobilidade sustentável e de qualidade nos meios urbanos.  

Como implementar? 

O Plano de Mobilidade Urbana é o principal instrumento de efetivação da Política Nacional de Mobilidade Urbana. Para sua implementação é possível utilizar como base as diretrizes colocadas em documentos que se pautem na priorização e estruturação do transporte público, a pé e por bicicleta. Podem também ocorrer parcerias com empresas e instituições2 interessadas no assunto, de forma a auxiliar os gestores e capacitar equipes técnicas de planejamento e execução do plano.  

Leis municipais também podem ser decretadas a fim de amparar a implementação do Plano de Mobilidade Urbano, como aquelas relacionadas à planos de ciclovias e corredores de ônibus. Além disso, é de grande importância que se realizem estudos da situação atual da cidade, previamente à elaboração do plano, de forma a embasar as possíveis intervenções.  

Os modelos de implementação dos planos de mobilidade devem, primeiramente, pensar em formas de captar e manter recursos de maneira estável ao longo dos anos. Em 2017, o Governo Federal criou o programa Avançar Cidades – Mobilidade Urbana, com o objetivo de fomentar, por meio de financiamento, a criação de cidades com melhores condições de mobilidade, sobretudo, pela priorização dos meios não motorizados ou públicos. Os recursos são provenientes do FGTS e o programa se divide em dois grupos, conforme a dimensão populacional do município.  

Outras formas de captação de recursos estão relacionadas a bancos – como CEF, BID, BNDES – e parcerias com o setor privado. A arrecadação por estacionamento em áreas públicas pode ser também uma das formas mais eficazes de manutenção de um fundo municipal de mobilidade, além de desestimular o uso de automóveis na cidade. 

Em termos regionais, um consórcio entre munícipios pode ser interessante para a elaboração de um plano que considere tal escala, como é o caso do PLAMUS, Plano de Mobilidade Sustentável da Grande Florianópolis, que se encontra em desenvolvimento e que, além de incluir a capital catarinense, contempla também os treze municípios da Grande Florianópolis. 

Quais os benefícios de implementar um Plano de Mobilidade Urbana? 

Uma política urbana de mobilidade sustentável atrelada a um plano de mobilidade é uma das formas mais relevantes de promoção da qualidade de vida nas cidades. Além da diminuição dos impactos ambientais diretos, há redução de congestionamentos e melhoria da qualidade do ar.   

Estudo de Caso Nacional 

A cidade de Belo Horizonte, número cinco no ranking da Urban Systems de mobilidade urbana no Brasil, juntou forças com o World Resources Institute – WRI e desenvolveu um programa para incentivar empresas a criarem planos de mobilidade para facilitar o deslocamento de trabalhadores. Este programa faz parte do Plano de Mobilidade de Belo Horizonte sendo uma estratégia importante que envolve parcerias com empresas. Igualmente, Belo Horizonte tem avançando na mobilidade urbana, com a inauguração do seu sistema BRT em 2014, desenvolvendo também um plano de mobilidade corporativo para o Centro Administrativo de Minas Gerais.  

Estudos de Caso Internacionais 

Uma iniciativa que vem se tornando cada vez mais frequente, sobretudo em cidades da Europa, é o desenvolvimento dos chamados Workplace Travel PlansConhecidos em português como Planos de Mobilidade Corporativos, eles visam a implementação de estratégias relacionadas ao incentivo de melhores práticas de mobilidade em empresas e outros espaços de trabalho ou estudo. Eles partem da premissa que a maior parte das viagens realizadas, diariamente nas cidades, estão relacionadas aos fins de estudo e de trabalho e que assim, as empresas e instituições relacionados a estes têm significativa influência sobre a forma como as pessoas se locomovem nos meios urbanos.  

Na cidade de Londres, o incentivo ao desenvolvimento desse tipo de plano faz parte da agenda política da cidade relacionada à mobilidade urbana. Como forma de promover o desenvolvimento sustentável na cidade, o Transport for London, órgão responsável pelo planejamento do transporte de Londres, publicou um guia de referência voltado para Planos de Mobilidade Corporativo (“Guidance for workplace travel planning for development”). Ele visa assegurar que os empreendimentos em Londres adotem certas medidas e estratégias, de modo a controlar os impactos que estas viagens causam sobre o transporte público e sobre o uso de automóveis.  

A elaboração desse tipo de plano, segundo o documento, deve ser feita de acordo com as demandas dos empregados e da empresa, sem desconsiderar a rede de transporte existente. Boas práticas devem envolver medidas de redução da necessidade de viagens, bem como o incentivo a meios de locomoção sustentáveis. A implementação de bicicletários e outras estruturas relacionadas ao uso de bicicleta, a limitação da oferta de vagas de estacionamento para automóveis, o incentivo a caronas, são algumas das medidas sugeridas pelo guia, disponível em http://content.tfl.gov.uk/guidance-workplace-travel-planning-2008.pdf.

Referências e onde encontrar mais informações 

Lei Nacional nº 10.257, de 10 de julho de 2001 – Estatuto da Cidade http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/leis_2001/l10257.htm  

Lei Nacional nº 12.587, de 03 de janeiro de 2012 – Política Nacional de Mobilidade Urbana http://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/2012/lei-12587-3-janeiro-2012-612248-norma-pl.html  

Lei Nacional nº 13.146, de 06 de julho de 2015 – Estatuto da Pessoa com Deficiência http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13146.htm  

Site da Confederação Nacional do Transporte (CNT)  http://www.cnt.org.br/  

Artigo sobre o Índice de Qualidade de Calçadas (IQC), publicado na Revista dos transportes públicos, 2001                                                                       https://mobilidadeape.files.wordpress.com/2015/05/c3adndice-de-qualidade-das-calc3a7adas-antp.pdf  

Site do Instituto De Políticas De Transporte E Desenvolvimento (ITDP) http://itdpbrasil.org.br/  

Relatório sobre Vida e Morte das Rodovias Urbanas, preparado pelo ITDP, 2013  http://2rps5v3y8o843iokettbxnya.wpengine.netdna-cdn.com/wp-content/uploads/2015/05/vida-e-morte-das-rodovias-urbanas.pdf   

Índice de Caminhabilidade Versão 2.0, preparado pelo ITDP, 2018 http://itdpbrasil.org.br/icam2/  

Guia de Planejamento de Sistemas de Bicicletas Compartilhadas, preparado pelo ITDP, 2014 http://2rps5v3y8o843iokettbxnya.wpengine.netdna-cdn.com/wp-content/uploads/2014/11/ITDP-Brasil_Guia-de-Planejamento-de-Sistemas-de-Bicicletas-Compartilhadas_1a-vers%C3%A3o.pdf   

Índice de Planejamento Ciclo inclusivo, preparado pelo ITDP, 2017 http://2rps5v3y8o843iokettbxnya.wpengine.netdna-cdn.com/wp-content/uploads/2017/09/guia-cicloinclusivo-ITDP-Brasil-setembro-2017.pdf   

Programa Nacional de Capacitação das Cidades do Ministério das Cidades http://www.capacidades.gov.br/  

Manual de Planejamento Cicloviário, preparado pelo Ministério dos Transportes2001 http://projects.mcrit.com/tiete/attachments/article/291/Manual%20de%20planejamento%20ciclovi%C3%A1rio%20-%20GEIPOT%20-%202001.pdf   

Política nacional de desenvolvimento urbano, preparado pelo Ministério das Cidades, 2004 http://www.capacidades.gov.br/biblioteca/detalhar/id/103/titulo/Cadernos+MCidades+1-+Politica+Nacional+de+Desenvolvimento+Urbano#prettyPhoto   

Manual Brasileiro de Sinalização de Trânsito, preparado pelo DENATRAN e Ministério das Cidades, 2007                                    https://www.denatran.gov.br/images/Educacao/Publicacoes/MANUAL_VOL_I.pdf  

Caderno de Referência para Elaboração de Plano de Mobilidade por Bicicleta nas Cidades, preparado pelo Ministério das Cidades, 2007 http://www.ta.org.br/site/Banco/7manuais/cadernosite2007xz.pdf   

Cartilha sobre a Política Nacional de Mobilidade Urbana, preparada pelo Ministério das Cidades, 2013  http://www.portalfederativo.gov.br/noticias/destaques/municipios-devem-implantar-planos-locais-de-mobilidade-urbana/CartilhaLei12587site.pdf  

PlanMOB: Caderno de Referência para a elaboração de Plano de Mobilidade Urbana, preparado pelo Ministério das Cidades, 2015  http://www.cidades.gov.br/images/stories/ArquivosSE/planmob.pdf   

Manual de Apoio a Municípios até 100 mil habitantes – Programa de Apoio à Elaboração de Planos de Mobilidade Urbana, preparado pelo Ministério das Cidades, 2017 http://www.capacidades.gov.br/biblioteca/detalhar/id/344/titulo/programa-de-apoio-a-elaboracao-de-planos-de-mobilidade-urbana  

Relatório sobre Veículos Elétricos, preparado pela Bloomberg New Energy Finance, 2018 (página em inglês) https://about.bnef.com/electric-vehicle-outlook/#toc-download  

Plano de Mobilidade Urbana Sustentável da Grande Florianópolis – PLAMUS http://www.plamus.com.br/plamus.html 

Informações sobre o Programa Avançar Cidades – Mobilidade Urbana, do Ministério das Cidades https://www.cidades.gov.br/informativos-semob/5277-avancar-cidades-mobilidade-urbana  

Plano de Mobilidade Corporativa e Gestão de Demanda de Viagens, preparado pelo WRI Cidades http://wricidades.org/nosso-trabalho/projeto-cidade/mobilidade-corporativa  

Mais informações sobre o Plano de Mobilidade Corporativa de Belo Horizonte http://wricidades.org/noticia/belo-horizonte-lan%C3%A7a-pol%C3%ADtica-que-fomenta-participa%C3%A7%C3%A3o-do-setor-privado-na-gest%C3%A3o-da   

Guidance for workplace travel planning for development  http://content.tfl.gov.uk/guidance-workplace-travel-planning-2008.pdf  

Guia prático sobre estacionamento e políticas de gerenciamento de mobilidade na América Latina, preparado pelo Banco Interamericano De Desenvolvimento, 2013 http://2rps5v3y8o843iokettbxnya.wpengine.netdna-cdn.com/wp-content/uploads/2015/07/BID_Guia-pr%C3%A1tica-de-estacionamento-e-pol%C3%ADticas-de-GM-na-Am%C3%A9rica-Latina_em-PT_vers%C3%A3o-WEB.pdf  

Planos de Mobilidade Urbana – Abordagens Nacionais e Práticas Locais, preparado pela GIZ, 2015 http://2rps5v3y8o843iokettbxnya.wpengine.netdna-cdn.com/wp-content/uploads/2015/03/td13_urbanmobilityplans_pt.pdf